O que médicos, vendedores e prestadores de serviço devem ter em comumUma das lições que vendedores e prestadores de serviço recebem quando iniciam a carreira é a de saber ouvir. Só assim alguém está apto a atender o cliente da maneira adequada. Receber informação para poder dar a informação correta, seja sob a forma da indicação de um produto ou uma solução, eis a lógica da coisa.
Tudo perfeito, não fosse por um detalhe: ouvir é mais difícil do que parece. “Quando você ouve uma história”, diz a médica Lisa Sander, professora de Yale, “sua mente está tentando descobrir o significado dos fatos que você está recebendo” (Folha de S. Paulo, 02/10/2011). Daí para sair conjecturando potenciais soluções ou ater-se mais às suas próprias hipóteses do que ao que diz o cliente, é um pulo.
Se numa situação trivial de consumo isso já pode redundar em problema, o que dizer em um consultório médico? Tema da matéria da Folha na qual Lisa Sander foi entrevistada, a incapacidade de os médicos ouvirem os pacientes é resultado de um somatório de fatores. O primeiro deles: uma diferença de importância atribuída ao problema que leva o paciente ao consultório. Para o paciente, trata-se do maior problema de saúde do mundo – pois, afinal, é aquele que o acomete. Para o médico, trata-se apenas de mais um caso entre tantos parecidos atendidos ao longo de um dia (ou de uma carreira).
Segundo: médicos são pessoas, não máquinas. Cansam-se, aborrecem-se, distraem-se. Todos os profissionais estão sujeitos a quedas de rendimento em seu dia-a-dia, e se elas podem parecer pequenas para o profissional – “apenas 1 dos 20 pacientes que atendi não recebeu a atenção adequada” –, para o paciente vítima do vacilo a falha é de 100%.
Por fim, um terceiro fator. Médicos, em seu esforço de diagnóstico, compreensivelmente tentam obter as informações que julgam importantes para identificar um problema. Se por acaso o relato do paciente foge do script, trazendo informações que o profissional não julga relevantes, ele “desliga” do que está sendo dito – ou interrompe o paciente, para perguntar algo que lhe interesse (segundo uma revista científica, depois de 16 segundos de relato, em média).
Não se trata de um problema exclusivo dos consultórios, como sabemos. Professores e orientandos, técnicos em informática e usuários de computadores, consultores e empresários, vendedores e compradores – não há atividade em que saber ouvir não seja importante. Mas quantos de nós é capaz de manter a atenção a tudo o que é dito pela outra parte, sem distrair-se ou ficar tentado a interromper?
Ao contrário de produtos, que saem das fábrica exatamente iguais, serviços são variáveis – e, por isso, mais passíveis de diferenciação. Geralmente, imaginamos que essa diferença decorra de fatores como conhecimento técnico e experiência dos profissionais envolvidos. Nem sempre. Às vezes, está simplesmente na capacidade de ouvir.
Fonte: http://www.amanha.com.br/sr-consumidor/2618-saber-ouvir